A cena política brasileira assiste a um movimento de rara intensidade, com a revelação de que a decisão do ex-presidente americano Donald Trump de sobretaxar em 50% os produtos importados do Brasil está provocando um substancial desgaste no grupo político de Jair Bolsonaro. Longe dos microfones e das declarações públicas de apoio irrestrito, aliados do ex-mandatário (PL) admitem reservadamente uma crescente apreensão diante dos impactos econômicos e políticos da medida tarifária. O “tarifaço”, longe de ser um evento isolado no cenário internacional, projeta-se internamente como um catalisador de fissuras na base de apoio bolsonarista, questionando a eficácia da diplomacia exercida durante a gestão anterior e a real capacidade de influência sobre o aliado americano, outrora tão celebrado.
A tentativa de blindar o ex-presidente e seu entorno das consequências diretas dessa política comercial agressiva, que atinge em cheio setores vitais da economia brasileira, mostra-se cada vez mais difícil. O que antes era uma aliança inabalável, construída sobre afinidades ideológicas e uma proximidade pessoal entre os dois líderes, agora se vê posta à prova pelas duras realidades do comércio internacional e seus reflexos no eleitorado. A percepção de que a medida de Trump não apenas prejudica a economia nacional, mas também fragiliza a narrativa de “grande amigo do Brasil”, gera um incômodo palpável entre figuras antes incondicionalmente leais.
A apreensão dos aliados não é apenas teórica; ela se materializa em críticas que circulam em ambientes mais restritos, como os grupos de WhatsApp do agronegócio. Esse setor, tradicionalmente uma das bases mais sólidas de apoio a Bolsonaro, começa a dar sinais de insatisfação. A percepção de que o apoio do ex-presidente neste segmento pode ser minoritário neste momento é um indicativo alarmante para o bolsonarismo, que sempre pautou sua relação com o agro como um pilar de sua sustentação política e eleitoral. O impacto direto das tarifas nas cadeias produtivas e na competitividade dos produtos brasileiros transforma a questão econômica em um dilema político de difícil gerenciamento.
A Fratura na Base Aliada e a Realidade dos Impactos
A notícia de que aliados de Jair Bolsonaro admitem o desgaste político decorrente do “tarifaço” de Donald Trump revela uma fratura incipiente na base de apoio do ex-presidente. Essa admissão, feita em caráter reservado, contrasta com a postura pública de blindagem e de minimização dos impactos, sugerindo que a extensão do problema é maior do que se quer admitir oficialmente. A apreensão desses aliados é um sintoma da percepção de que a conta da política externa pautada em afinidades pessoais, em detrimento de pragmatismo comercial, está chegando, e quem a pagará, em última instância, é a economia brasileira e, por tabela, a sustentação política de um grupo.
O impacto da sobretaxa de 50% nos produtos importados do Brasil pelos EUA não é meramente estatístico; ele se traduz em perdas concretas para exportadores, produtores e trabalhadores brasileiros. Setores como o agronegócio, que dependem significativamente do mercado americano para escoar sua produção, são os mais atingidos. A inviabilidade econômica de operar sob tal ônus tarifário força a busca por novos mercados, a renegociação de contratos e, em última instância, a redução da atividade, com possíveis reflexos em empregos e investimentos. Essa realidade econômica, que afeta diretamente a base eleitoral do bolsonarismo, gera um desconforto político que se manifesta nas críticas internas.
A dissonância entre a retórica de amizade e a ação protecionista de Trump expõe a vulnerabilidade de uma estratégia diplomática que priorizou laços ideológicos em detrimento de acordos comerciais sólidos e multifacetados. A dependência de uma relação baseada em personalidades, e não em instituições e interesses de Estado, mostrou-se frágil quando os interesses econômicos dos Estados Unidos, sob o prisma de Trump, prevaleceram. O desgaste político de Bolsonaro e seu grupo, portanto, não é apenas um reflexo da medida de Trump, mas da percepção de que a aposta em uma aliança incondicional não se traduziu em proteção para a economia brasileira.
O Agronegócio em Desencanto: Um Pilar Abalado
O setor do agronegócio, historicamente um dos pilares de sustentação política de Jair Bolsonaro, emerge como um foco de “desgaste” significativo para o ex-presidente e seu grupo. As críticas que circulam em grupos de WhatsApp do setor são um sinal de alarme, revelando que a base de apoio ruralista, outrora monolítica, começa a manifestar descontentamento com as consequências diretas das tarifas de Trump. Essa insatisfação é particularmente preocupante para o bolsonarismo, que sempre cultivou uma imagem de defensor intransigente dos interesses do agronegócio, muitas vezes em detrimento de outras pautas.
A percepção de que o apoio a Bolsonaro no agronegócio é “minoritário neste momento” é uma constatação que acende a luz vermelha. Se o setor que mais se beneficiou da retórica pró-mercado e da flexibilização ambiental durante seu governo começa a questionar a eficácia de sua influência e a absorver os prejuízos de uma política externa pautada por alinhamentos ideológicos, o impacto eleitoral pode ser duradouro. O agronegócio é pragmático por natureza; suas decisões são guiadas por dados de mercado, rentabilidade e acesso a compradores, e não apenas por afinidades políticas ou discursos.
A atuação de figuras como Eduardo Bolsonaro, que em diversos momentos buscaram endossar a retórica de Trump e aprofundar o alinhamento ideológico, também se vê sob escrutínio. A ausência de resultados práticos em termos de proteção comercial, frente às ameaças americanas, faz com que as críticas se estendam a ele. Para o agronegócio, a questão não é ideológica, mas econômica: as tarifas representam perdas financeiras concretas e um obstáculo à competitividade. Esse desencanto de um setor tão estratégico é um dos sinais mais evidentes do abalo na popularidade de Bolsonaro e na coesão de seu grupo político.
A Diluição da Blindagem e as Críticas a Eduardo Bolsonaro
A “blindagem” que cercava Jair Bolsonaro em relação aos efeitos negativos de suas alianças internacionais começa a se diluir diante do “tarifaço” de Trump. Antes, qualquer crítica a essa estratégia era rechaçada veementemente pela base de apoio, que defendia a proximidade com Washington como um trunfo geopolítico. Agora, com o impacto financeiro direto nas exportações, essa narrativa se fragiliza. A percepção pública de que a “amizade” com Trump não se traduziu em proteção contra medidas protecionistas, mas sim em vulnerabilidade, mina a credibilidade de um discurso que antes parecia inabalável.
As críticas a Eduardo Bolsonaro, que sempre atuou como um dos principais articuladores do alinhamento com a administração Trump e com a direita internacional, também ganham força nesse cenário. Sua atuação, vista por muitos como uma extensão da política externa bolsonarista, é agora questionada pela falta de resultados concretos na prevenção dessas tarifas. A expectativa, por parte de setores produtivos e até de parte da base aliada, era que a suposta influência sobre Trump pudesse evitar tais medidas punitivas. A ausência dessa proteção gera frustração e põe em xeque a eficácia de sua diplomacia paralela.
A ausência de margem para questionamento interno, antes imposta no grupo bolsonarista, cede espaço a um debate, ainda que reservado, sobre a estratégia adotada. A pressão econômica é um vetor poderoso de desarticulação política. O fato de as críticas estarem surgindo em grupos privados e no seio do agronegócio é um indicativo de que a paciência de setores antes fiéis está se esgotando. A diluição da blindagem e o foco das críticas em figuras como Eduardo Bolsonaro demonstram que o custo político das tarifas de Trump está sendo absorvido pelo núcleo do bolsonarismo, gerando um efeito cascata que pode abalar sua estrutura.