É bonito no telão, mas quem anda de ônibus sabe onde o pneu fura
A nova Gerência de Transporte Público, inaugurada com pompa no Terminal Coletivo de Alagoinhas, promete trazer “modernidade” para o sistema de transporte coletivo. Uma central com GPS nos ônibus, aplicativo com rotas em tempo real, controle de frota, nome do motorista e do cobrador, horários de início das viagens e, claro, discursos ensaiados sobre acolhimento ao cidadão. Tudo muito bonito no papel. Tudo muito moderno — mas com ônibus de ontem.
Enquanto a tecnologia avança na tela, o povo continua enfrentando carros velhos, atrasos diários, superlotação e quebras no meio do caminho. A nova central pode até acompanhar o veículo ao vivo, mas não consegue evitar que o ônibus fume no meio da avenida ou quebre antes de chegar ao bairro periférico. Como se coloca um chip moderno em frota sucateada e se espera eficiência?
É como instalar o Waze em uma carroça.
Não há como negar: monitoramento é um passo importante. Mas quando se vende “sistema moderno”, espera-se um serviço moderno. E isso exige ônibus novos, renovação de frota, conforto mínimo, rampas de acessibilidade funcionais, ar-condicionado que não sirva só de promessa em campanha. O que temos, hoje, é um contraste gritante: um centro de controle com telas e dados, mas sem o básico nas ruas.
A gestão municipal anuncia, com entusiasmo, que “agora o usuário poderá saber onde está o ônibus”. Uma maravilha — desde que o ônibus esteja mesmo circulando. Porque, em muitos bairros, o que se sabe com certeza é que ele não vem.
E a pergunta permanece: qual a mágica prometida? Como um sistema tão moderno funcionará com veículos tão obsoletos? Como fiscalizar rotas com uma frota que não dá conta de cumprir os horários, ou simplesmente não aparece? A promessa é que o aplicativo trará segurança e previsibilidade. Mas, até agora, o único movimento previsível no transporte público da cidade tem sido o atraso.
Modernizar não é apenas digitalizar. É ouvir o povo, atualizar contratos, exigir contrapartida real das empresas, renovar os veículos, capacitar os profissionais, planejar com base nas demandas de quem usa. Colocar GPS em carro velho é como colocar perfume em porco — disfarça, mas não muda o cheiro.
A população de Alagoinhas merece um transporte digno. A cidade cresceu. O número de estudantes, trabalhadores e usuários aumentou. O sistema não pode continuar tratando deslocamento urbano como favor — é direito.
Enquanto isso, seguimos assistindo à modernização pela metade: um monitoramento de tela cheia para uma frota de quinta. Mais um capítulo da gestão que adora uma solenidade, mas ainda não entendeu que mobilidade não se resolve com discurso bonito nem aplicativo de vitrine — resolve-se com ônibus funcionando.
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