Hélio Liborio
Hélio Liborio

Pitaco

A Farda que Une, ou Apenas Veste o Sonho?

Português

Enquanto a máquina administrativa de Alagoinhas se empenha em distribuir kits de uniformes com o propósito de promover segurança, igualdade e um senso de pertencimento, emerge a reflexão sobre o que de fato se transforma com um gesto tão simbólico. Entregar a farda, ornamentada com as cores da cidade — branco, vermelho e preto — é, sem dúvida, um ato que comunica a importância da identidade e da padronização. Entretanto, o que é necessário para que essa iniciativa não se limite a um belo anúncio de campanha, mas se traduza numa transformação estrutural no universo educacional?

Num contexto onde a educação deve ser o alicerce para o desenvolvimento social, a distribuição gratuita dos uniformes às 2.860 crianças das 12 creches municipais representa um avanço pedagógico e social inestimável. A Secretaria Municipal de Educação, sob a condução de Rita de Cássia Bastos, exalta que este gesto simboliza – em termos práticos e afetivos – a valorização dos jovens cidadãos, que já se veem refletidos na nova identidade visual da Rede Municipal de Educação.

Contudo, para os críticos que se alimentam de discursos carentes de substância, é necessário lembrar que um uniforme, por si só, não resolve os desafios estruturalmente enraizados do sistema educacional. A padronização torna visíveis as nossas aspirações de uma escola digna — onde cada porteiro, professor e diretor desempenha seu papel com a mesma dignidade que se espera dos pequenos que agora vestem o fardamento. Se o governo, por meio do prefeito Gustavo Carmo, aposta nesta ação para construir um ambiente mais organizado e de maior identificação, cabe então a nós questionar: será que os investimentos em infraestrutura, formação docente, e políticas de apoio ao aprendizado não deveriam caminhar de mãos dadas com a distribuição de uniformes?

Pois bem, a farda é um símbolo e, como tal, carrega consigo a promessa de pertencimento. Mas o verdadeiro desafio está em transformar essa promessa num compromisso contínuo com a educação, que transcenda o ato de vestir e promova um ambiente de ensino digno e inovador. Se o ato de padronizar reflete, de fato, o cuidado com a imagem institucional, é imperativo que cada recurso aplicado na farda seja revertido, também, em melhorias que toquem o cotidiano dos estudantes e de seus responsáveis.

Nesse ínterim, celebrar a gratidão dos pais e a alegria do primeiro sorriso estampado no rosto de uma criança que recebeu sua farda é válido. Contudo, é preciso que esse sentimento ecoe e se traduza em políticas públicas robustas, que se estendam muito além de um kit distribuído num dia comemorativo. Que o uniforme seja visto como parte de uma narrativa maior, na qual a educação se reinventa e acolhe o cidadão como ser integral, sem distinções.

A gestão de Alagoinhas celebra, portanto, esses 100 dias – ou melhor, este capítulo de gestos simbolicamente ricos – com a esperança de que cada ação se converta num passo firme na construção de um futuro onde o ensino seja, de fato, transformador. Que a farda não seja apenas um adereço, mas o emblema de uma escola que se dignifica e que inspira o leitor crítico a sonhar com uma educação que une e transforma.

English