
O Linhas de Fato quer saber: por que há situações que são tão confusas de se entender, mas tão rotineiras de se repetir? A verdade é que, por trás da aparência de surpresa, o que se vê é o velho e conhecido teatro político — com direito a roteiro ensaiado, figurino do dia e uma plateia que já perdeu a paciência, mas segue assistindo.
Na sessão da última terça-feira (01), a Câmara Municipal foi palco de mais um espetáculo da tragicomédia institucional. A pauta? Estagiários da rede pública de educação. A denúncia? Atraso de pagamento, valores irrisórios e — o mais alarmante — o uso indiscriminado de estagiários como substitutos de professores e profissionais de apoio nas salas de aula. A indignação? Ensaiada, em grande parte. A ação concreta? Ainda aguardando no camarim.
O vereador Luciano Almeida (UB), em um raro rompante de contundência, qualificou a situação como absurda, desumana, e chegou a denunciar que até aposentados estariam ocupando vagas destinadas a jovens estudantes. Alguém avise que isso não é novidade — é apenas o retrato da precarização escancarada da educação pública.
Mas não faltou quem relativizasse. A vereadora Raimunda Florêncio (PSD) tratou a adesão ao estágio como escolha voluntária, quase um ato de liberdade. “Vai quem quer”, disse ela, como se necessidade não fosse um tipo de coerção. Como se os jovens estivessem na fila do estágio por capricho, e não por ausência de oportunidades, por fome, ou pela esperança de, um dia, serem tratados com dignidade.
Thor de Ninha (PT) entrou em cena como conciliador. Admitiu os problemas, mas pediu paciência, porque a atual secretária estaria tentando resolver. É o discurso da “boa vontade”, versão 2.0 — aquele que reconhece o caos, mas pede tempo, como se o tempo não tivesse sido generosamente dado em mandatos anteriores.
Já José Edésio (Progressistas), com fala diplomática, lembrou que estagiário é para aprender, não para ser explorado. Bonito no papel, difícil na prática. E mais difícil ainda quando o estágio vira buraco tapado de uma máquina pública que terceiriza não só serviços, mas responsabilidades.
A vereadora Juci Cardoso (PT), por sua vez, foi ao ponto: estágio não é substituição de professor. É formação. Alocar estagiários como regentes é ferir a legislação, desmoralizar o plano municipal de educação e repetir o erro que, travestido de solução emergencial, vira política permanente de improviso.
No fim das contas, o Linhas de Fato pergunta: se todos estão pasmos, indignados, surpresos — quem é, então, que vem mantendo o palco de pé? Porque o roteiro é velho, os personagens se alternam, mas o enredo continua o mesmo: precarização, omissão, terceirização. E muito, muito faz de conta.
A luz no fim do túnel? Parece mais com a luz do refletor. Porque por enquanto, segue tudo no palco: encenação.
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