
O temor do governo Lula de um salto inflacionário decorrente do “tarifaço” de Trump ilumina uma das mais insidiosas facetas da política comercial unilateral: o poder de exportar instabilidade econômica. A narrativa de que o Brasil tem sido “ruim” para os EUA, desmentida pelos números, ganha uma nova camada de perversidade quando suas consequências potenciais incluem a desorganização de cadeias de valor e o aumento de preços para o consumidor comum, longe dos gabinetes onde as decisões são tomadas. Não é apenas uma questão de comércio, mas de segurança econômica nacional, vulnerável a caprichos exógenos.
A preocupação com a inflação, para um país que historicamente sofreu com hiperinflação, é um fantasma que assombra qualquer governo. O desvio de fluxo de produtos, a pressão cambial e o aumento da incerteza são mecanismos reais de transmissão dessa inflação “importada”. No entanto, a mera constatação do risco não basta. A verdadeira prova de fogo para a política econômica brasileira será sua capacidade de construir resiliência interna para absorver esse choque, evitando que o ônus recaia majoritariamente sobre os mais vulneráveis.
A hora é de ação estratégica e não de complacência. O Banco Central precisará demonstrar sua independência e agilidade na gestão da política monetária, enquanto os ministérios econômicos devem trabalhar em uma coordenação impecável para fortalecer a produção interna, buscar a diversificação de mercados e, fundamentalmente, comunicar de forma transparente com a sociedade. O “tarifaco” de Trump é um teste severo, mas também uma oportunidade amarga para o Brasil reforçar suas defesas e mostrar que sua resiliência econômica pode superar não apenas os desafios internos, mas também as pressões externas mais arbitrárias.
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A Perspectiva de Longo Prazo e a Busca por Autonomia
A ameaça de inflação decorrente das tarifas de Trump, apesar de ser um desafio imediato, também impulsiona o governo Lula a considerar a perspectiva de longo prazo para a economia brasileira. Esse episódio serve como um forte lembrete da necessidade de o país reduzir sua vulnerabilidade a choques externos e fortalecer sua autonomia econômica. A diversificação de parceiros comerciais, a exemplo de países asiáticos e do próprio Mercosul, torna-se ainda mais estratégica para mitigar a dependência de um único mercado.
Além da diversificação, o incentivo à inovação e à agregação de valor na produção nacional ganha relevância. Quanto mais o Brasil depender da exportação de commodities sem beneficiamento, mais suscetível estará às flutuações de preços internacionais e a medidas protecionistas que visem o encarecimento de seus produtos. Investir em tecnologia, pesquisa e desenvolvimento pode permitir que o país ofereça produtos com maior valor agregado, menos sensíveis a tarifas e mais competitivos em diversos mercados.
A crise atual, portanto, embora traga consigo o risco inflacionário e desafios imediatos, também pode ser um catalisador para uma reavaliação profunda da estratégia de desenvolvimento econômico do Brasil. A busca por maior resiliência, autonomia e diversificação não é apenas uma resposta à crise de agora, mas um caminho para construir uma economia mais robusta e menos suscetível a pressões externas no futuro, garantindo a estabilidade de preços e o bem-estar da população.
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