Brasil em Xeque: O Desafio da Criticidade em Tempos de Polarização

O Brasil atravessa um momento delicado marcado por uma polarização política intensificada ao longo da última década. Essa divisão, que alimenta narrativas extremistas, tem minado a capacidade crítica da sociedade e contaminado o processo eleitoral. Com diferentes esferas de poder em disputa — municipal, estadual e federal — sobram dúvidas e promessas vazias. Olhando à frente, 2026 surge não apenas como mais um ciclo eleitoral, mas como um ponto potencialmente definidor para o futuro democrático do país.


A Polarização como Mecanismo Intencional

A polarização ideológica, entre direita e esquerda, consolidou-se no Brasil por meio de estratégias cuidadosamente construídas ao longo dos anos. Plataformas digitais, grupos políticos e instituições repetem narrativas que reforçam divisões, mobilizando seguidores de forma reativa e emocional. Esse cenário não é novidade, mas se intensificou com o aprimoramento de técnicas de segmentação e a amplificação de conteúdos extremos.

Essa construção deliberada de polarização fragiliza o debate público e reduz a profundidade das discussões. Temas complexos — como economia, saúde e educação — são simplificados em lemas maniqueístas, de “certo” ou “errado”, “nós contra eles”. A consequência é a perda da criticidade, essencial à vida democrática: cidadãos passam a reagir a símbolos partidários e slogans ideológicos — sejam eles vestem verde-amarelas ou discursos de salvação socialista — em vez de avaliar propostas e trajetórias. De um lado, o culto à moralidade abstrata; de outro, o uso do assistencialismo como muleta política. Em ambos os extremos, há o mesmo efeito: a paralisia do pensamento crítico e a manipulação da opinião pública para fins eleitorais.

O volume de informações e estratégias de manipulação têm efeito direto nas eleições. Candidatos passaram a explorar essa lógica de forma permanente: lançar adesivos, marcar antagonistas, desqualificar adversários — tudo por visibilidade imediata, reforçando um ciclo vicioso que sustenta a polarização.


Calendário Eleitoral Fragmentado e o Custo da Confusão

O mosaico eleitoral brasileiro, composto por três pleitos a cada quatro anos, gera uma sobreposição de campanhas e projetos. A cada dois anos, os eleitores são convocados para escolher uma combinação de posições: prefeito e vereador, presidente, senador, governador, deputados federal e estadual. Esse ritmo incessante envolve bilhões de reais e consome a atenção da sociedade.

No plano municipal, os orçamentos reduzidos levam os prefeitos a buscarem apoios políticos para garantir sobrevivência administrativa. Isso se traduz em indicações políticas, contratos emergenciais e priorização de favores locais, reforçando o famoso “toma lá, dá cá”. O resultado é uma gestão pautada por interesses imediatos, não pela estratégia de longo prazo.

Esse modelo, que se repete por todo o país, engessa políticas públicas e inviabiliza diagnósticos consistentes. A sucessão contínua de eleições institucionaliza uma lógica de curtos mandatos, guetos partidários e alianças voláteis, muitas vezes sem sintonia com as reais necessidades da população.


A Erosão da Criticidade Cidadã

A polarização ideológica combinada ao calendário fragmentado agrava a erosão da criticidade na sociedade. Cidadãos, bombardeados por narrativas polarizadoras, deixam de questionar substância e priorizam rostos e símbolos partidários. A âncora torna-se as bandeiras — e não as propostas.

Nesse contexto, promessas mirabolantes são repetidas exaustivamente, mas raramente implementadas. Contudo, a “ilusão do engajamento” inibe a exigência por resultados concretos. A superficialidade das discussões impõe uma barreira para identificar projetos factíveis, capacidades técnicas e verdadeiro compromisso dos candidatos.

Sem espaços de debate sólidos, os eleitores são induzidos a escolher por adesão, afeto ou antipatia ideológica. Elas se tornam escolhas simbólicas, reflexo de identidade grupal, não de análise racional do que cada projeto representa para o país. Essa dinâmica ameaça a qualidade do voto e alimenta um ciclo de frustração institucional.


2026: Cenário de Ruptura e Escolhas Decisivas

A corrida para 2026 se inicia sob um clima de tensão crescente. O pleito já é chamado de divisor de águas — equiparado a momentos históricos como a Ditadura, as Diretas Já e a redemocratização. Essa expectativa traz consigo riscos e esperanças.

De um lado, há a perspectiva de renovação: um eleitorado mais atento, capaz de dizer basta às velhas oligarquias, dirigentes de ocasião e promessas vazias. De outro, a ameaça do fortalecimento de lideranças extremistas, identificadas com discursos antidemocráticos, que usam o caos fraturado como plataforma de ascensão.

A grande questão será: haverá maturidade institucional para que políticas estruturantes sejam debatidas e escrutinadas? Avançar em uma agenda nacional coerente — como reforma tributária, desenvolvimento sustentável, inclusão social — depende de uma postura mais crítica e menos ideologizada por parte da sociedade.


A Urgência de Ampliar a Visão do Eleitor

O desafio, agora, é expandir a visão do eleitor além do carisma ou do discurso vazio. É preciso reconhecer que o que representa o povo — e projeta o futuro — não é o nome de um partido, mas o histórico e comprometimento de quem pretende ocupar o cargo.

Conhecimento e análise precisam preceder a simpatia ideológica. “Toda mistura na panela nem sempre condiz com o nome do prato” resume esse ponto: é possível que um candidato, mesmo sob bandeira bem posicionada, sequestre o discurso sem substância ou ações efetivas.

Cada eleitor deve rever a lógica do voto simbólico, considerando a experiência, integridade e conhecimento do candidato — e sua equipe. Avaliar propostas, triangulá-las com cenários reais e fontes confiáveis, estabelecer prioridades factíveis e medir a sensibilidade social devem orientar a escolha.


Riscos de um Retrocesso Democrático

O fosso político-ideológico, se intensificado de forma irresponsável, pode levar a um colapso institucional. Grupos organizados via “núcleos de células” — como movimentos ideologicamente mobilizados — corroem a pluralidade política e impulsionam um jogo que não é republicano.

Se a sociedade abdicar da criticidade e passar a delegar o futuro a lideranças populistas, o fenômeno de retrocesso pode ganhar força. O poder pode ser revertido em benefício particular, como apadrinhamentos, desmonte de instituições e distorção das eleições.

Em 2026, o risco de fortalecer uma agenda autoritária ou de promessas, mirabolantes permanece. Esse processo pode ser lento e insidioso, mas a tensão democrática é real. O ponto principal a ser lembrado é: dirigentes comprometidos não se encontram apenas pela sigla, mas por ações efetivas e coerência pública.


O Chamado para 2026

Chegando a 2026, o Brasil converte-se em uma encruzilhada histórica. Com o questionamento da eficácia institucional e o desgaste da política, a democracia demanda participação mais consciente — sem desesperança, mas com a atenção devida à trajetória dos candidatos. A sociedade precisa entender que a urgência não está na bandeira, nem nas promessas socialista, mas na substância de quem lidera. O futuro republicano do país está em disputa, e os brasileiros são chamados a escolher com coragem, crítica e coesão.