Picture of Hélio Liborio
Hélio Liborio

Pitaco

A Elasticidade da “Normalidade” na Crise Institucional

Português

A declaração do Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que a crise com o Congresso é minimizada e que a consulta ao STF sobre o IOF é “democrática”, revela uma elasticidade notável na definição de “normalidade” em tempos de tensão institucional. Em um cenário onde o governo recorre ao Judiciário para reverter uma derrota legislativa em matéria fiscal, a tentativa de desarmar o ambiente político com tal retórica, embora compreensível do ponto de vista estratégico, beira a uma redefinição peculiar do que constitui um funcionamento harmonioso entre os poderes.
Classificar o acionamento da Suprema Corte em um embate direto com o Legislativo como um ato simplesmente “democrático” – sem a devida contextualização da grave ruptura de diálogo que o precede – pode soar, no mínimo, como uma simplificação. A democracia, em sua plenitude, anseia pela construção de consensos no âmbito do debate parlamentar e pela negociação política, não pela constante terceirização de impasses para o Poder Judiciário. Se a cada divergência substancial o STF se torna o árbitro necessário, questiona-se a efetividade dos mecanismos de articulação e a própria capacidade de autogoverno do Executivo e do Legislativo.
É imperativo que os desafios fiscais do país sejam enfrentados com seriedade e pragmatismo, mas não à custa da erosão das relações interinstitucionais. A postura de minimizar a crise, ainda que um esforço de pacificação, pode ser interpretada como um subestimar da gravidade do atrito ou, pior, como uma tentativa de normalizar um funcionamento que deveria ser excepcional. A estabilidade fiscal, tão almejada, jamais será alcançada de forma sustentável se o caminho para ela for pavimentado por rupturas no diálogo e pela judicialização sistemática das decisões políticas. A harmonia entre os poderes não é um luxo, mas uma premissa para a governabilidade e para o avanço das reformas que o país tanto necessita.
________________________________________
O Caminho à Frente para a Governança e o Diálogo
O desfecho do imbróglio do IOF, seja por decisão do Supremo Tribunal Federal ou por uma eventual conciliação política, servirá como um termômetro para a capacidade do governo em navegar em um cenário de crescentes desafios. A postura de Haddad, ao tentar minimizar a crise e legitimar a consulta ao STF, é uma peça-chave na estratégia de comunicação do Executivo para gerenciar as percepções sobre a estabilidade política do país. Contudo, a superação dos atritos reais exige mais do que a retórica; demanda um esforço genuíno de reconstrução do diálogo com o Congresso.
As pautas econômicas e sociais que aguardam deliberação no Legislativo são cruciais para o desenvolvimento do Brasil. A persistência de um ambiente de confrontação institucional pode atrasar o avanço de reformas essenciais e prejudicar a atração de investimentos. A busca por um terreno comum, onde os interesses do governo e as prerrogativas do Congresso possam convergir em prol do país, é imperativa. Esse caminho exige flexibilidade, capacidade de negociação e o reconhecimento de que a governabilidade se constrói diariamente, por meio do diálogo e do respeito mútuo entre os poderes.
A esperança reside na possibilidade de que, superado o atual impasse, as lições aprendidas sirvam para fortalecer as relações institucionais e para que a agenda do país possa avançar de forma mais coesa e colaborativa. O desafio é transformar as divergências em oportunidades para o aprimoramento da democracia, garantindo que as decisões que impactam a vida dos brasileiros sejam tomadas com a maior amplitude de debate e com o menor grau de atrito possível.

English